Grande Coração de Ouro - Capítulo 1

    Ela não teve culpa pelo modo que reagiu contra o pai de Aisha, sua dona, pois estava apenas se defendendo. Contudo, não houve justificativa que a impedisse de agora ser carregada pelo cangote até a carroceria da caminhonete, na qual é amarrada a uma corda, sem opção de fugir.

    Alimentar a família estava complicado, quem dirá um animal.

    "Mesmo sendo pequena!" o pai de Aisha exclama enquanto sua filha implora para deixar a gata, ainda filhote, em casa, mas nada adiantou.

    Ele está disposto a não mudar de ideia porque desde o início nunca gostou da gata, então receber arranhões e mordidas foram fundamentais para esta decisão.

    Por fim, dá a partida na caminhonete e segue pela estrada de terra, levantando poeira quente em frente à sua filha, que está com o rosto inchado de tanto chorar.

    Depois da caminhonete percorrer por bastante tempo entre as savanas, o pai de Aisha estaciona, desamarra a gata e, em seguida, a lança no meio do gramado, logo retornando a caminho de casa.

    Estar em uma situação tão repentina a tornou incapaz de conseguir cair em pé e impedir o impacto contra o gramado, rolando alguns centímetros violentos até terminar com o corpo estirado, ferido e encardido. Foi preciso alguns minutos para entrar em desespero.

    —  Po-por que ele me trouxe aqui?? Aargh... — a pata direita dela sangrava em dor. — Eu não quis fazer aquilo! Eu juro... — diz olhando em todas as direções com as orelhas abaixadas.

    À beira da estrada, com a pata manca, deita na esperança de sua dona aparecer para busca-la, sem acreditar naquilo que está acontecendo.

    Deseja que tudo seja um sonho ruim, no entanto, devido as dores que sente, se convenceu de que não está dormindo no tapete da cozinha.

    A filhote adormece no começo da noite enquanto espera uma possível chegada de Aisha, porém, mais tarde, o vento frio a acorda, tremendo junto ao som de corujas que observam sobre as árvores ao redor.

    A curiosidade a fez se aproximar de uma delas.

    — Olá? — sussurra, diante dos olhos amarelos na copa da acácia.

    — Uuh... Uma filhote? — diz a fêmea de bufo-malhado. — O que está fazendo aqui, pequena?

    — O pai da Aisha me trouxe aqui porque ficou muito brabo comigo, eu mordi a mão dele... — demonstra um olhar abalado.

    — Não ensinaram a você que não deve se aproximar dos humanos? — deduz sobre humanos, pois ouviu a caminhonete mais cedo.

    — Mas Aisha cuida de mim, ela vai vir me buscar.

    — Uuh... Nesse caso, não deve ficar sozinha aqui durante à noite, alguns animais podem acabar machucando você.

    — Que animais?! Por que eles vão me machucar?!

    — Não se preocupe. — dá passinhos pelo galho. — Suba aqui, deixo você ficar comigo até o amanhecer, quando já estiver seguro.

    Mesmo com dificuldade devido à sua pata ferida, a filhote escala a árvore até o galho da coruja e se ajeita para dormir.

    O amanhecer logo chega com o sol escondido atrás das nuvens.

    Após largar um pequeno rato sobre o galho, a bufo-malhado balança as asas na direção da filhote, a fim de acorda-la.

    — Ahn..? — abre os olhos, sonolenta. — O que é isso?

    — É comida, um rato.

    — Um rato? Por que comer um rato? — diz entre bocejos.

    — Uuh... Apenas coma, tenho certeza que deve estar com fome. — meio aflita. — Você precisa se alimentar porque ainda está crescendo. — fecha os olhos enquanto se aconchega entre as asas.

    — Eu nunca comi um rato... — diz hesitante.

    — Apenas coma logo, você não tem outras opções. — permanece de olhos fechados.

    — Mas ele... — de repente se assusta com a bufo-malhado, que, de orelhas eretas, abre as asas impaciente.

    Minutos mais tarde ambas estão quietas, principalmente a filhote, pois não soube como comer o rato.

    Então, o silêncio é quebrado pela coruja, que finalmente resolve falar, afinal, durante seu descanso, pensava na situação que se encontra.

    A presença da filhote não é um incômodo, no entanto, por ser um cheiro novo, acaba se tornando arriscado tê-la por perto, visto que a coruja possui ovos para proteger.

    — Mas, e se Aisha voltar e não me encontrar? — diz confusa, mesmo que a bufo-malhado tenha explicado tudo direitinho.

    — Pequena, aqui onde estamos é muito longe dos humanos, acho que Aisha não conseguiria encontrar você. — sente um aperto por estar, talvez, destruindo a esperança dela.

    — Ma-Mas eu quero ver Aisha... — entristece.

    — Que tal... — olha a estrada, pensando. — Você seguir na mesma direção que aquilo que te trouxe aqui foi embora? Talvez assim você possa encontrar Aisha. — diz incerta.

    — Mas, e os animais que vão me machucar?

    — Você pode se camuflar na grama. — a bufo-malhado novamente não foi compreendida pela filhote, que fez um olhar confuso. — A cor de seu pelo é parecida com a cor da grama, então use isso para se esconder e também para caçar.

    — Mas... Eu tenho mesmo que ir?

    — Infelizmente tem, pequena, e você vai me ajudar fazendo isso.

    — Oh... — abaixa o olhar. — Então, apenas tenho que andar pela estrada, me esconder e caçar? Mas eu não sei caçar.

    — Tenho certeza que você consegue aprender.

    A filhote respira fundo, pensa mais um pouco e olha para a coruja, que assente paciente aguardando a partida dela.

    — Tchau, senhora coruja, obrigada por cuidar de mim. — diz, agora descendo pelo tronco.

    — Tchau, pequena, tenha cuidado e não confie em qualquer um que você encontrar.

    Ela concorda com o alerta da bufo-malhado enquanto se dirige à estrada, mas, em seguida, se vira novamente.

    — Esqueci de contar, meu nome é Abayomi.

    Continua... Capítulo 2